Palavras

Brinco com as palavras do mesmo jeito que brincava de playmobil quando criança. Despretensiosamente, meio passatempo, meio compulsão. Tenho que escrever.Por sinal, comecei a escrever ainda criança (o que prova que nem sempre melhoramos com o tempo). Era algo natural. Eu “roteirizava” a brincadeira, sempre tinha uma história por trás das aventuras ocorridas no quintal. O passo seguinte foi passar para o papel aquelas mesmas histórias. Nasceu, então meus primeiros dos livros, lançados quando eu tinha entre 6 e 9 anos. Eram do tamanho de 1/8 de ofício, P&B, umas 5 páginas. Desempenhava também a função de ilustrador. Graças a boa vontade dos meus pais em embarcarem na brincadeira.

Depois de um pequeno ostracismo, comum a todas as “crianças prodígio”, voltei a escrever na adolescência, junto com um amigo meu, em uma publicação chamada “Hipócritas”. Devido a um profundo anacronismo nosso, éramos James Dean em plenos anos 90, éramos iconoclastas, satíricos, soltos no “Velho Paes”, Colégio que ainda hoje se ufana de ser o “Colégio mais antigo do Brasil em funcionamento!”. Cada edição nos valia uma ida à coordenação ou diretoria. Colávamos o nosso jornal nas paredes do colégio, curtíamos o momento de fama, e passávamos horas tentando defender a “liberdade de expressão”.

Teve uma ocasião em especial que nossa ida para o SOESE (acho que era essa a sigla da orientação escolar) nos valeu um debate ideológico com o Pinduca, o Rei do Carimbó. O mesmo estava lá por que sua sobrinha precisava justificar umas faltas, pois contratar parentes para dançar carimbó não é considerado nepotismo. Em pouco tempo, o mesmo relembra os tempos da caserna e discursa sobre a importância do “sangue na sarjeta” (expressão literalmente utilizada) para a manutenção do Estado Democrático de Direito. Saí de lá imaginando as mensagens subliminares por trás do “macacuo do macaco macacu macacual, eu conheço um macaquinho que é filho do macacão…”

Nesta época, comecei a enveredar pela poesia. Todo poeta adolescente teve um sublime objetivo para percorrer as veredas do verso e rima – arrumar namorada! Óbvio. Achava que os versinhos desencontrados e comuns iriam compensar a falta de encantos físicos. E pior, não era o único que achava. Passei a fazer poeminhas encomendados pelos meus amigos. Talvez fiasco defina bem os resultados. Ou tragédia. Ou melhor, tragicomédia: pra nós, trágico, pra elas, comédia.

Na fase adulta, novo ostracismo. As coisas perdem um pouco a graça quando se está no início da vida adulta. Depois melhora de novo, quando se aprende que não se deve levar-se tão a sério. É a maturidade, que só será plena quando formos de novo crianças.
Reencontrei a escrita já na Igreja, com a criação do “Do Outro Mundo”, meu micro-jornalzinho cristão. Foi a minha trincheira, onde defendi o que tenho por verdade, mais ou menos do mesmo jeito que aqui. Parei de escrever em uma noite escura, e depois resisti em me institucionalizar.

Hoje, só brinco com as palavras. Preciso delas, são ótimas companheiras. Elas organizam o meu mundo caótico de ideias, sonhos, loucura e fé. Eu as uso para me expandir, elas me usam para existirem.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *